28 junho 2011

Pilar

A tua lembrança criou a noite. Solitária, morosa, vil. Criou-a com o intuito de azoar o meu descanso, quarto minguante carregado de desejos.
Desfiz a cama e quase me cheirou a ti, ao teu perfume impregnado nos lençóis cor de feno; quase senti as tuas mãos a percorrer-me o corpo, a tua boca buscando a minha, o teu olhar buscando o meu… Desfiz a cama e estendi-me nela. Desnudo, desamparado, eu sem ti.
Cada manhã é chuva ácida e corrosiva, um aguaceiro capaz de consumir qualquer porção de pele onde caia. Sublimação e silêncio.
Levaste-me o coração sem o prometer de volta. Entretanto, a vida cimentou-se numa estrutura surda-muda, tal aplasia deste peito inabitado. Sem abrigo, sem alicerce, sem pilar.
Ainda assim não me cansei da demora, da desarmonia de cada elemento, do mirar transeunte sobre uma vida embalsamada… Por agora, quero apenas forjar os dias deste amor edificado e apontar um abraço e um beijo, tal impotência de tos dar pessoalmente.

You left a lovestain on my heart
And you left a bloodstain on the ground,
But blood comes off easily...

(José González)